"Existe um tipo de particularidade quase mística em torno de qualquer composição lançada pela curitibana ruído/mm. Mesmo a inexistência de palavras ou a ausência de qualquer interação que não a instrumental com o ouvinte, de forma alguma impede que cada música desenvolvida pela banda seja capaz de contar histórias ou expor versos imaginários tomados de concisão. Vindos de um dos trabalhos mais completos lançados na última década e um dos registros que melhor exemplificam a crescente participação do pós-rock em solo nacional (A Praia, de 2008), o quinteto paranaense transforma seu mais novo disco em mais um passeio por um mundo de delírios instrumentais (des)controlados e um lirismo que não carece de palavras para se pronunciar.
Muito longe das experiências jazzísticas que tomavam conta de seu anterior registro, em Introdução à Cortina do Sótão (2011, Sinewave) a banda paranaense investe em um trabalho que mesmo afundado em sons sutis e paredões instrumentais tomados de delicadeza acaba se projetando como um álbum muito mais fácil e que parece voltado para hipnotizar qualquer um que jamais tenha se esbarrado com os ruídos do grupo. Denso, ao mesmo tempo que extremamente volátil, o disco vai aos poucos tricotando uma trama instrumental calorosa, adornada de sons que se projetam de forma detalhista, porém direta em sua essência.
Havia de forma bastante perceptível em cada segundo que conduzia A Praia, ou mesmo o EP de 2004, Série Cinza, uma espécie de composição atmosférica na musicalidade do grupo. Cada uma das músicas presentes no disco pareciam de forma lenta se entrelaçar, como se de fato todas as canções fossem na verdade uma única criação, apenas fracionada de forma organizacional. Mesmo a ordem das canções dentro do álbum pareciam se comportar de forma exata, como se fosse praticamente impossível apreciar o trabalho sem a específica temática e posição estipulada no decorrer do disco.
Em seu novo álbum, entretanto, o quinteto explora uma temática completamente oposta, tanto na maneira como as canções são espalhadas ao longo do registro, como na própria instrumentação que dita o rumo das faixas. Cada uma das seis canções presentes no disco caminham por uma via própria, como se fossem elas donas de seus próprios caminhos e não o quinteto que as gerencia ou mesmo a própria atmosfera do trabalho. Essa escolha resulta em um trabalho mais livre, menos conceitual, porém não menos interessante ou vasto, afinal, cada composição que se projeta ao longo do registro carrega as mesmas experiências dos dois álbuns anteriores, talvez até de forma muito melhor resolvida e dinâmica.
Ao contrário do que parecia movimentar os antigos registros da banda, em Introdução à Cortina do Sótão torna-se possível sentir e apreciar cada instrumento que vai se desdobrando no desenvolvimento das composições. Diferente das antigas criações do grupo, em que todos os elementos da faixa pareciam se aglutinar em prol de um som mais cerebral e intransponível – ouça Praieira e perceba como todos os sons se convergem para um ponto único da música -, com o atual registro ou mais especificamente em músicas como Petit Pavé e O Prestidigitador é possível perceber cada mínimo elemento das canções, como se mesmo existindo uma convergência final, cada instrumento se manifestasse em um espaço próprio.
Introdução à Cortina do Sótão não é um trabalho nem melhor, nem pior do que seu antecessor, apenas um registro que partilha dos mesmos princípios temáticos e instrumentais, porém opta por um rumo diferenciado. De maneira inegável o álbum se propõem de forma completamente não hermética, reproduzindo harmonias instrumentais que poderiam compor as bases de qualquer grupo contemporâneo que delimite suas bases no rock alternativo. Despojado e surpreendentemente encantador, o álbum apenas comprova a versatilidade do quinteto curitibano, não mais um grupo que merece as atenções de algum seleto nicho, mas uma banda que merece os olhares e os ouvidos de todos os públicos.
Introdução à Cortina do Sótão (2011, Sinewave)
Introdução à Cortina do Sótão (2011, Sinewave)
Nota: 8.2
Para quem gosta de: Labirinto, Constantina e A Banda de Joseph Tourton
Ouça: Esquimó e O Prestidigitador"
Originalmente publicado aqui.
Para quem gosta de: Labirinto, Constantina e A Banda de Joseph Tourton
Ouça: Esquimó e O Prestidigitador"
Originalmente publicado aqui.
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